Hoje, o meu carro foi para abater... ao fim de 10 anos na minha posse... ao fim de 106.000 km percorridos.
Deu-me mais alegrias que tristezas. E juntos passámos bons e maus momentos.
Primeiro, falo dos maus momentos, para que possa terminar em beleza:
- Lembro-me duma vez em que o Clio começou a deitar um espesso fumo branco pelo capot: tinha furado um tubo de água no radiador. Felizmente estava a 500 metros de uma oficina.
- Uma noite, ia a sair com o carro e rebentou o cabo do pedal da embraiagem. Felizmente estava à porta de casa.
- Tive um encontro imediato com um Autocarro da STCP numa manhã de domingo, após uma noite de chuva. Reparação do autocarro: 18 contos (ainda era em contos). Reparação do Clio: 250 contos.
- Por duas vezes deixei as luzes do carro acesas, que me drenaram a bateria.
- Tempos houve em que o carro soluçava nas subidas do IC1 (estrada que percorro muitas vezes): tinha partido a base do carburador.
- Quando a panela de escape furou, tive a sensação de estar a pilotar um carro de rally.
- Uma vez, o termóstato do radiador pifou e o carro foi aquecendo constantemente à medida que ia percorrendo os quilómetros no IC1. Parei na Póvoa de Varzim com o ponteiro da temperatura quase na zona vermelha (e em riscos de queimar a junta da colassa). Fizeram-me uma ligação directa à ventoínha, colocaram a chauffage no máximo e lá segui viagem.
- Ao descer a Serra da Estrela, o carro embalava mesmo em segunda. A utilização dos travões valeu-me uma esquentadela jeitosa e um cheirinho característico a ferodo. Mas os travões, depois de arrefecidos, ficaram como novos e cumpriram a sua missão durante mais uns milhares de quilómetros.
Pensando bem, o carro quase nunca me deixou ficar verdadeiramente mal. Fartei-me de passar por BMW e Mercedes encostados na berma das auto-estradas. Isso nunca me aconteceu. Foi um bom carro. E deu pena entregar um carro para abate em tão bom estado de conservação. Mas, com 15 anos, ninguém me dava os €1500 que lucrei com este procedimento.
Do lado positivo, tenho as viagens que fiz, as conversas que tive com ele... algumas confidências, alguns desabafos... as pessoas que transportei e outras que queria, mas nunca consegui transportar. Foi nele que aprendi verdadeiramente a conduzir e é a ele que dedico este texto.
Os meus amigos associam o meu carro a um peluche que trouxe pendurado durante muitos anos no espelho retrovisor interior: o Patrício.
O Clio, o Patrício e eu vivemos uma aventura que durou 10 anos e que hoje finda. Marcava o contador 158.949 km. E já tenho saudades.
Até sempre.